quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

220... Minas dos Carris na segunda metade do Inverno (I)


Minas dos Carris, 4 de Fevereiro de 2015

(A primeira parte pode ser vista em "220... Minas dos Carris na segunda metade do Inverno (II)".)

Estava escuro mas as estrelas já se haviam apagado quando cheguei à Portela do Homem. Na passagem pela Portela de Leonte, a neve mostrava-se por entre o lusco fusco do dia que ao longe começava a surgir por entre os picos serranos. Confesso que foi com algum receio que por ali passei; o brilho no asfalto fazia-me pensar numa travagem repentina e numa consequente derrapagem que me fizesse lamber a berma. Fica nesta situação àquela hora não era muito conveniente. Porém, Leonte ficou para trás e era tempo de respirar o ar que diziam frio em preparação da jornada que se avizinhava.

Estava frio, sim, mas não aquele «frio» que esperava. Esperava por aquele «frio» que enregela de imediato as fossas nasais e que expulsaria no momento os farrapos de sono de uma noite curta. Bom, lá teria de viver com isto e esperar não adormecer encostado ao primeiro pinheiro que me aparecesse pelo caminho.

Apesar de ter posto o frontal a jeito, por truques de magia o dia havia aparecido do nada... que coisa estranha! Bom, o caminho é meu conhecido e a história da jornada podia-se resumir a uma cadência de topónimos embelezados com a neve (assim como aqueles títulos grandes que muitas publicações...). A verdade é que a certeza da neve era garantida e mais garantida ficou quando ao chegar à ponte sobre o Rio Homem, me surgiu a Encosta do Sol aperaltada de branco lá nos píncaros. A coisa prometia!


A neve começou a aparecer mesmo antes do Bosque da Abilheirinha com a sua fonte de água fresca (ou fria?). Aqui a paisagem era já pintada de branco e a neve já se fazia escutar no caminhar. Foi um dia de muito trabalho para a máquina fotográfica e cada paisagem familiar estava diferente. Bem... diferente, diferente, não. Digamos antes: única! Assim, lá vai mais uma ou duas fotografias! Felizes somos nós que a era do digital nos veio abençoar...

Havia nevado na noite anterior e assim a paisagem e o caminho estavam repletos de neve fresca onde as pegadas e as passadas iam ficando marcadas de forma cadenciada. Em pouco tempo, já mesmo antes da passagem do Modorno, as biqueiras das botas tinham um castelo de neve, e mais adiante já seria necessário levantar mais as pernas para não formar uma parede de neve à minha frente... era como fazer um step au naturel!

A Água da Lage do Sino repartia-se entre uma cascata de gelo e a água que ia escapando às garras do frio. Ao longe, e iluminada pelo Sol por entre as nuvens negras que vinham da Galiza, a Serra Amarela mostrava-se também pintada de branco.



Se por vezes o céu azul conseguia furar por entre as nuvens, outras encontrava-se rodeado por um nevoeiro que parecia bloquear o som. Era um silêncio profundo que se abatia sobre a montanha e mesmo o Rio Homem parecia por vezes só murmurar por entre as rochas. Era um cenário de solidão, frio e gelo, mas que por vezes era vencido por um vasto horizonte e uma luz que marcava o princípio e o fim do caminho. Porém, nesta altura, era sempre tempo de voltar as costas e prosseguir caminho por entre a neve que se avolumava a cada passo que dava. Chegado às Águas Chocas, caminhava em cima de placas de gelo e por um corredor de paredes brancas de neve, geladas e frias. A água ia gotejando das estalactites que se formavam como pontas de lança que brotavam das paredes. As árvores cobertas de gelo pareciam seres míticos parados no tempo à espera de dias mais longos para trazer um novo ânimo ao local. 

Chegado às Abrótegas é todo um cenário de branco que se estende perante mim. Com o passar do nevoeiro é mesmo quase impossível ver algo para lá de uns poucos metros, no entanto o caminho vai-se «abrindo» à minha frente. Em certas ocasiões a neve chega acima do joelho e o caminhar torna-se cansativo; noutras caminha-se facilmente por cima da camada de neve suficientemente gelada para aguentar o peso.


Os últimos currais ficam então para trás e passado pouco tempo chega-se à subida final. A Corga da Carvoeirinha será sempre o último desafio a vencer até chegar ao prémio. Este encontrava-se encoberto por um nevoeiro que por vezes ofuscava as casas, mas em certas altura o azul do céu compunha o cenário. 

Tentar descrever o frio é tarefa difícil... As mãos não aguentam dois minutos fora das luvas principalmente devido ao vento cortante que por vezes se faz sentir. Quando o céu abre e o vento pára, velem os segundos de sensação do tépido calor na pele exposta. Porém, logo de seguida tudo se esvai e o frio retoma o seu lugar.

As Minas dos Carris eram naquele instante um mundo de gelo num misto de alegria e melancolia do lugar. De felicidade e de tristeza. De força e fraqueza perante os elementos. Uma fortaleza de emoções que se espalhavam pelos grandes espaços quando estes se libertavam da tenaz do nevoeiro.

Em pouco tempo era tempo de regressar...

Algumas imagens do dia...














































Fotografias © Rui C. Barbosa (Todos os direitos reservados)

Sem comentários: